quarta-feira, 30 de setembro de 2009

A Criança que não aprende na escola

A criança que não aprende na escola, por Jordano Copetti* | TEMA PARA DEBATE
A criança que não aprende na escola, por Jordano Copetti*

Os problemas de aprendizado escolar atingem mais de 20% das crianças nos Estados Unidos. No Brasil, onde os índices de desenvolvimento global são piores, sabemos que as dificuldades de aprendizado são muito mais prevalentes. Mais de 90% de nossas crianças terminam a 1ª série do ensino básico sem saber ler ou lendo de forma muito deficiente. Segundo o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), 59% dos alunos da 4ª série não desenvolveram competências elementares de leitura! Vinte e dois por cento sequer podem fazer a prova, pois não leem absolutamente nada! E outras tantas demonstram profundas deficiências em matemática, pois não conseguem nem fazer cálculos simples de somar. Mas como é que essas crianças chegaram até a 4ª série? Tem algo errado nisso!

Os governos enfatizam a necessidade da educação para o desenvolvimento do país e criam programas para manter as crianças em sala de aula (por exemplo, vinculando ajuda financeira com a frequência da criança em aula, como no Bolsa-Família, programas de distribuição de leite e de merenda escolar, proibição da repetência nos anos iniciais ou estimulando políticas de inclusão), mas as autoridades governamentais estão desinformadas sobre a principal causa de evasão escolar e do péssimo desempenho da educação básica no Brasil. Não é a pobreza extrema ou a falta de alimentos, mas sim a incapacidade do aluno de aprender. Proibir a repetência em nada ajuda, porque, se a criança não aprendeu, pior é seguir em frente, com conteúdos cada vez mais incompreensíveis para ela. Só repetir não basta, nem permanecer seis horas na escola, é preciso também diagnosticá-la e tratá-la, coisa que não se vê em nenhum programa governamental de educação (normal ou especial). Para a inclusão, outra bandeira vazia do governo, faltam evidências científicas e métodos validados, pois não basta incluir essas crianças em aulas regulares se os problemas não são identificados e reabilitados. Repetir o ano, passar sem aprender ou a simples inclusão acabam sendo medidas inócuas ou mesmo prejudiciais.

Não adianta que o governo alardeie que praticamente 100% das crianças brasileiras estão matriculadas na escola, quando a capacidade de aprendizado e o desempenho acadêmico, que são os fatores que fazem a diferença, apresentam níveis comparados aos países africanos mais pobres. Aonde é que podemos chegar com este padrão de educação?

A noção básica para diagnóstico e tratamento dos transtornos do aprendizado é desconhecida da grande maioria dos médicos e dos profissionais que trabalham nesta área no Brasil. Estamos com décadas de atraso em relação aos Estados Unidos neste aspecto e, se continuarmos assim, vamos ter poucas chances de alcançar um nível de desenvolvimento pelo menos próximo ao dos países do Primeiro Mundo.

Precisamos alertar as escolas e os governos sobre a elevada prevalência das dificuldades de aprendizado. A escola que não se preparar para receber esses alunos estará deixando de cumprir seu papel social e também estará perdendo a oportunidade de sobressair às demais escolas e de ganhar mais respeito e maiores lucros. Os governos que negarem estas evidências vão ver um país que se desenvolve muito abaixo de sua potencialidade.

*Médico psiquiatra, especialista em psiquiatria da infância e da adolescência e fundador do Centro de Atenção, Memória e Aprendizado de Cruz Alta


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